Reuniões de conselho e 3 livros

Correria boa por aqui. Como já mencionei no passado, escrita para mim é terapia, então voltemos ao divã compartilhando conhecimento que pode ser relevante para mais gente.

Dois acontecimentos recentes da minha vida profissional trazem as reflexões desta edição: (1) me juntei ao conselho da Tupi, uma startup investida pela gigante Raizen Power que foca em facilitar a transição energética nas estradas, por isso trago uma estrutura objetiva e funcional sobre como tocar reuniões de conselho de forma produtiva; (2) colocamos para rodar a primeira turma do programa Expansão de Negócios, realizado junto ao G4 e encabeçado pelo brilhante Paulo Guedes. Foi uma honra ter desenhado e entregue este primeiro programa com o Paulo e o Phillip Trauer (investidor de VC que eu admiro), além da equipe energizada e competente do G4. Entre tantas lições práticas compartilhadas, o Paulo recomendou 3 livros que impactaram sua jornada com empreendedor. É conhecimento muito valioso para não ser compartilhado :).

Da esquerda para à direita: eu, Julian Tonioli, Paulo Guedes e Phillip Trauer nos bastidores, antes de iniciarmos a sessão da tarde do segundo dia da nossa formação

Sobre reuniões de conselho

Elas são uma oportunidade única para a equipe de liderança receber uma perspectiva independente e crítica sobre o negócio. Um bom conselho faz as perguntas certas e traz transparência e “accountability” aos responsáveis pelos grandes projetos. Já estive em ambos os lados dessa mesa, tanto como operador no iFood quanto como conselheiro, e sei o impacto transformador que esse ritual pode ter.

No entanto, é triste ver que muitas reuniões de conselho se tornam apenas sessões de relatórios, desperdiçando uma oportunidade de ouro para discutir e alinhar questões estratégicas. A chave está em planejar essas reuniões de forma eficaz.

Segue aqui uma sugestão de como aproveitá-las ao máximo:

1. Material de Leitura Prévia (Pre-read): Envie um resumo prévio para que todos cheguem à reunião com uma compreensão clara dos assuntos importantes. Isso deve ser enviado com pelo menos 2-3 dias de antecedência. O que incluir:

– Atualização de Vendas: Pipeline, estado das contas principais e projeções para os próximos 3-6 meses. Isso dá uma visão clara de onde estamos e para onde estamos indo.

– Atualização de Tecnologia: Principais prioridades e lançamentos esperados nos próximos meses. Aqui, destacamos como a tecnologia está impulsionando nossa estratégia.

– Atualização Financeira: Demonstração de resultados, balanço patrimonial e previsão de caixa para os próximos 12 meses. Isso é crucial, especialmente em momentos de incerteza no mercado de capitais.

– Atualização de Pessoas: Contratações recentes, posições-chave a serem preenchidas e quaisquer saídas significativas. O talento é o coração de qualquer organização.

– Principais Preocupações do CEO: Liste os 1-2 pontos que mais preocupam a liderança. Estes são os pontos que precisam de atenção urgente, pois podem impactar a estratégia da empresa. Pode ser relacionado ao product-market fit, desafios de crescimento, gargalos operacionais, necessidades de capital, movimentos da concorrência, etc.

2. Revisão do Pre-read: Durante uma reunião mensal ou bimestral de 2 horas, reserve 30-60 minutos para discutir o material de leitura prévia. Esse tempo deve ser utilizado para discussão, não para apresentação. Assuma que todos já leram o material, o que facilita uma conversa mais produtiva.

3. Tópicos Estratégicos: Use o tempo restante para discutir 1-2 tópicos estratégicos que estão tirando seu sono. Esse é o momento de aproveitar ao máximo o conhecimento e a experiência dos conselheiros, obtendo feedback valioso e novas perspectivas.

4. Participação da Equipe de Liderança: Convide os principais membros da sua equipe de liderança para partes específicas da reunião. Eles devem estar presentes durante a revisão do pre-read e nas discussões sobre os tópicos estratégicos. Isso permite uma troca mais rica e direta com o conselho.

5. Sessão Exclusiva do CEO: Recomendo que o CEO inicie e finalize a reunião com uma sessão exclusiva com o conselho. No início, é o momento de alinhar expectativas e destacar onde mais precisa de suporte. No final, é a oportunidade de receber feedback sobre a reunião e identificar pontos que precisam de maior atenção.

Dica Final: Deixe o ego de lado. Esteja aberto para ouvir, ser desafiado e, ao mesmo tempo, educar o conselho sobre as nuances do negócio. Embora tenham muita experiência, eles podem não conhecer tão bem o seu negócio quanto você.

3 livros indicados por Paulo

O programa Expansão de Negócios foi desenhado para ajudar empresários a refletirem e estruturarem a próxima fase de crescimento de seus negócios. Eu trouxe muita coisa que vivenciei na McKinsey, iFood e como investidor e conselheiro de startups que decolaram, quebraram, se fundiram, compraram negócios menores e, eventualmente, foram adquiridas por gigantes. O Phillip trouxe sua experiência como investidor em empresas incríveis como Buser, Merama e Loft. Já o Paulo Guedes compartilhou sua visão e experiência prática como fundador e conselheiro de grandes empresas, como BTG Pactual, Abril Educação e Crescera. Além de ser um grande economista e empreendedor, Paulo é uma pessoa incrível, com uma energia contagiante e uma paixão evidente em ajudar o Brasil e os brasileiros a prosperarem. Entre tantos cases e lições práticas apresentados, Paulo recomendou 3 livros que mudaram sua forma de pensar e executar na jornada de criação de grandes negócios. São eles:

  1. Feitas para Durar: Práticas Bem-sucedidas de Empresas Visionárias, de Jim Collins: O livro entra nos “porquês” do sucesso duradouro de empresas visionárias e duradouras, mostrando que um líder carismático não é a salvação e que é preciso ter ideologia, saber selecionar as pessoas certas, valorizá-las, treiná-las e que o lucro não deve ser o norte principal.
  2. Estratégia Competitiva, de Michael Porter: Um clássico. É essencial estudar sua indústria, ganhar clareza sobre seu posicionamento e reforçar suas vantagens competitivas. Esse livro é uma obra prima dos estudiosos e práticos de estratégia. Aqui, Michael Porter, uma das lendas vivas da Harvard Business School, apresenta as diferentes forças competitivas que afetam um negócio, bem como possíveis estratégias para competir, penetrar e abandonar mercados, além de identificar oportunidades.

    Porter ajudou a abrir os olhos das empresas para as forças competitivas que nem sempre aparecem em seu radar, como novos entrantes e produtos substitutos. Além disso, ele mostra como o poder de barganha de poucos fornecedores ou de muitos clientes podem espremer as margens de um negócio mal posicionado.

    Em resumo, Porter fornece uma estrutura sólida para entender a concorrência e desenhar um plano claro sobre como ganhar o jogo. O sucesso a longo prazo não vem de seguir tendências, mas de entender profundamente as forças que moldam a concorrência – as regras do jogo – e de posicionar a empresa para tirar proveito dessas forças.
  3. Decisão! Como Grandes Líderes Fazem Escolhas, de Noel Tichy: A ideia do livro é que a capacidade de tomar decisões acertadas nos momentos críticos é o que separa os grandes líderes dos demais. Tichy mostra como a capacidade de ler o ambiente e tomar boas decisões é a chave para ser um líder de impacto, seja ao escolher as pessoas certas, definir estratégias ou enfrentar crises.

Nas palavras de Guedes, “esses autores são os melhores do mundo em suas áreas, e esses livros representam o trabalho de uma vida. Vejam que maravilhoso, temos acesso a um conhecimento incrível por um custo muito baixo, que é o preço de um livro”. O duro é que numa sociedade que busca gratificação imediata, sentar e ler textos longos virou um desafio e uma raridade.

Às vezes, parar para estudar e aprender com os melhores nos economiza anos de experiências frustradas de tentativas e erros. Dá para chamar de investimento estratégico, aquele que você sai do modus operandi do dia-a-dia e investe seu recurso mais valioso (tempo) naquilo que não trará retorno imediato.

Em frente, bora construir!

Alex


Você não precisa de mais intensidade; você precisa de mais consistência. A intensidade impressiona; a consistência transforma.

PS.: não sei quem é autor desta frase, mas li em algum lugar e achei válido e relevante, por isso compartilho :).

Fora da curva

Sucesso sem obsessão é possível? Bem, depende de como você define sucesso — portanto a resposta é que sim, é possível encontrar e viver a sua definição de sucesso sem obsessão. Agora, se estamos falando de atingir resultados fora da curva, que se destacam da maioria, que vão além da média, minha conclusão é que não. Não acredito que seja possível ser notável sem um investimento igualmente acima da média de tempo, foco e energia. Independentemente da área, até hoje não encontrei nenhum outlier que não tenha investido muito para conquistar seus resultados. Quem promete o contrário está mentindo. Não tem fórmula mágica. É uma mistura de suor, lágrimas e … risadas, porque dificilmente alguém consegue ir além da “média” se não estiver se divertindo e ganhando energia com o processo.

Eu sou apaixonado por esportes e por mexer o corpo, e o triatleta alemão Jan Frodeno é um cara que me chama a atenção. Jan foi medalhista de ouro no triatlo masculino nos Jogos Olímpicos de Verão de 2008 em Pequim. Venceu por três vezes o Campeonato Mundial Ironman, em 2015, 2016 e 2019, e duas vezes o Campeonato Mundial Ironman 70.3, em 2015 e 2018. Estabeleceu o recorde mundial para a longa distância em 2016, com o tempo de 7:35:39 horas (a média masculina deste esporte que é por definição brutal é de 13 horas). Em 2021, quebrou seu próprio recorde com um tempo de 07:27:53, estabelecendo um novo melhor mundial para o triatlo de longa distância. Quem vê o cara nas redes sociais parece que é fácil. Será mesmo?

Jan se aposentou do triatlo competitivo há pouco, mas continua vivendo com intensidade. Mergulhei na sua história para entender como a rotina de treinos e nutrição dele se comparava a outros atletas, porque quem olha de fora tem a impressão que sua vida é suave e linear, e às vezes atribuímos resultados extraordinários à sorte ou à genética (que não deixa de ser sorte). Não é o caso de Jan, e acho que não é o caso de ninguém que é foda no que faz. Triatletas profissionais treinam em média 30 horas por semana, Jan chega a treinar 45. Acompanhando um vídeo que mostra sua rotina, o clássico “day in the life”, me impressionou que seu dia começa às 5.30am na piscina, segue para uma corrida de 10Km ao ar livre, 65Km de bike pela estrada, treino de bike e fortalecimento indoor e, para finalizar o dia, treino de tiro de corrida ao anoitecer. Veja o que ele fala: “enquanto meus concorrentes estão sentados na mesa de jantar comendo, o fim do dia é meu horário favorito de treinar. Eu sei que estou me martelando, dando o meu melhor, indo até o limite”. Não é genética, não é sorte; é processo, disciplina, consistência, suor. É obsessão. A versão light desta mensagem, conforme dizemos na Faria Lima, é o clássico “there’s no free lunch“, ou “não existe almoço grátis”.

Jan Frodeno takes career-defining win at PTO US Open - Triathlon Magazine  Canada
Jan Frodeno em uma de suas últimas provas como triatleta profissional no PTO US Open em 2023

Para nós, mortais que mesmo que com muita vontade não poderíamos treinar 40 horas por semana porque treino não paga boletos, não é diferente. O desafio é encontrar o que te energiza de verdade para então dedicar as horas, disciplina e foco necessários para construir histórias e resultados excepcionais. Esqueça a narrativa de seguir sua paixão: as paixões mudam com a maturidade e à medida que vivemos e aprendemos, mas nossas fontes de energia tendem a se manter bem mais constantes. A maioria segue o status quo, percorrendo rotas já batidas daquilo que é considerado sucesso pela massa. Ao seguir aquilo que não conversa de verdade com o que lhe gera energia, as pessoas se conformam em navegar na mediocridade e param de questionar e buscar. A realidade é que quando entregar além da média se torna um fardo a conta não fecha; mesmo com insistência, não será um caminho sustentável. É a fonte do burnout e outras mazelas. Para a conta fechar, é preciso que o suor, e as vezes até as lágrimas, seja um combustível interno que deixa o motor mais forte e melhor. É preciso amar o processo — ou a jornada, como eu gosto de chamar.

E o equilíbrio entre vida pessoal e profissional? Acho difícil ter uma vida consistentemente equilibrada. Às vezes o pêndulo pesa para o profissional, especialmente em momentos de grandes entregas e quando abraçamos projetos novos; em outros momentos, é necessário que dediquemos mais tempo ao pessoal. Nunca é 50:50. Obsessão e grandes entregas estão também relacionadas a foco, e não somente a horas investidas. Saber dizer não, eliminar os ruídos, cortar aquilo que não conversa com a história que está sendo escrita é prerrogativa para uma vida rica, com entregas profissionais fora da curva e a construção de uma família. Por isso é importante saber: que história está sendo criada? Em business, chamamos isso de estratégia, mas a pergunta é relevante a tudo e a todos.

Que história você está construindo?

Alex

É tão simples: gaste menos do que você ganha. Invista com inteligência. Evite pessoas tóxicas e atividades tóxicas. Tente continuar aprendendo durante toda a sua vida. E pratique muita gratificação adiada. Se você fizer todas essas coisas, é quase certo que terá sucesso. E se não fizer, você vai precisar de muita sorte. E você não quer precisar de muita sorte. Você quer entrar em um jogo onde é muito provável que você ganhe sem precisar de sorte incomum.

Charlie Munger