2024 promete? Finja até conseguir

Hoje eu resgato um tema que abordei 6 meses atrás e que cai como uma luva nesta época em que estamos quase parando para descansar, refletir e planejar. Eu sou apaixonado por psicologia, e trago aqui um dos meus textos favoritos sobre a ciência e a arte de ser antes de ser.

Quando eu fui fazer meu MBA nos Estados Unidos, uma das primeiras expressões novas que eu ouvi foi o fake until you make it, ou finja até conseguir. Como brasileiro, a expressão me soou perversa, como se fosse um incentivo a mentira, a enrolação, e ao faz de conta. No contexto de um dos lugares mais capitalistas do planeta que é a Harvard Business School, interpretei a mensagem como se fosse “enrole todo mundo até você ficar rico, depois você pode fazer o que quiser e ser autêntico”. Para usar outra expressão do inglês, soou como a mais pura bullshit.

Se você está no corre e quer só o resumo:

  • Fake it until you make it é uma expressão em inglês que remonta ao campo da psicologia e ao conceito de “autopromoção”, proposto pelo psicoterapeuta Alfred Adler. O cerne da ideia é que, ao assumir uma postura confiante e agir como se já estivéssemos alcançado o sucesso desejado, podemos influenciar positivamente nossa mentalidade e comportamento, criando oportunidades para o sucesso real.
  • Para ilustrar este conceito na prática, divido minha experiência. Apesar de soar como falcatrua quando o ouvi pela primeira vez no contexto do meu MBA em Harvard, senti na pele as benesses do fake it until you make it ao me expor além do meu nível de confiança e encarar este tipo de risco. Aos poucos fui ganhando mais e mais segurança na minha habilidade de expor e debater posturas fortes e controversas em sala de aula.
  • Corroborando o fake it until you make it por uma ótica acadêmica, no livro “Act Like a Leader, Think Like a Leader” a professora Herminia Ibarra destaca a importância de assumir uma postura mais dinâmica e experimental na busca do desenvolvimento de liderança. O cerne da obra gira em torno do conceito de que a mudança ocorre através da ação. Em vez de esperar por uma transformação interna para nos tornar líderes, devemos agir como líderes desde o início, buscando oportunidades para assumir responsabilidades e experimentar diferentes papéis. Ao agir dessa forma, ampliamos nossos conhecimentos e habilidades, desenvolvendo uma identidade de liderança mais autêntica e eficaz.
  • Por outro lado, na contramão do nosso crescimento, está o spotlight effect, para continuar usando expressões da terra do tio Sam. O “efeito holofote” refere-se a um fenômeno psicológico em que a pessoa tende a acreditar que está sendo observada e notada de forma mais intensa do que realmente está. Essa percepção leva a uma autoconsciência e preocupação excessiva com a própria aparência, comportamento e desempenho em situações sociais. Seria o contrário do fake it until you make it: neste, expomos mais do que somos, esticando o músculo do crescimento pessoal; no outro (spotlight effect), expomos menos do que somos por medo do julgamento, e encurtamos o músculo que alavanca o nosso crescimento. 
  • Nos anos 2000, um grupo de acadêmicos realizou um estudo em que os participantes usavam camisetas com uma estampa bem chamativa e, em seguida, estimavam quantas pessoas notaram o desenho. Os resultados revelaram que os participantes superestimaram significativamente a quantidade de atenção recebida. Em média, os participantes estimaram que 50% das pessoas que interagiram com eles notaram suas camisetas com estampas vergonhosas; na prática, apenas 25% de fato perceberam. Ou seja, tipicamente superestimamos o quanto os outros prestam atenção no que fazemos e deixamos de arriscar a exploração de novos comportamentos e territórios por motivos irracionais.

Orgulhoso e temeroso na sala de aula da Harvard Business School

Quando eu fui fazer meu MBA nos Estados Unidos, uma das primeiras expressões novas que eu ouvi foi o fake it until you make it, ou finja até conseguir. Como brasileiro, a expressão me soou perversa, como se fosse um incentivo à mentira, à enrolação e ao faz de conta. No contexto de um dos lugares mais capitalistas do planeta que é a Harvard Business School, interpretei a mensagem como se fosse “enrole todo mundo até você ficar rico, depois você pode fazer o que quiser e ser autêntico”. Para usar outra expressão do inglês, soou como a mais pura bullshit.

Alguns meses do programa de MBA foram passando, minha ansiedade sobre não dar conta daquela jornada intensa foi diminuindo, e eu fui entendendo na prática o que o fake it until you make it significa. O programa de MBA de Harvard é puxado e 50% da nota de cada disciplina vem da participação em sala de aula. A pressão é enorme porque o sistema de notas é uma curva forçada onde os 10% que apresentam o melhor desempenho tiram a nota 1, os 80% seguintes a nota 2, e os últimos 10% tiram a nota 3. A perspectiva de tirar uma nota 3 apavora os alunos do primeiro ano, especialmente porque alunos que tiram nota 3 em 50% ou mais dos cursos de determinado semestre são convidados a refletirem por um ano sobre seus valores e pontos fortes, o equivalente a uma reprovação de ano. É o sonho virando pesadelo rapidinho na cabeça de quem está maravilhado e assustado com as belezas e rigores da famosa Harvard.

Os americanos aprendem a debater e a falar em público desde pequenos; portanto, para eles é natural. Para os estrangeiros, especialmente nós, brasileiros, que aprendemos inglês depois dos 20 anos de idade, defender ideias e debatê-las em inglês perante uma turma de 90 jovens ambiciosos e sedentos para discordar do seu argumento é um tanto desafiador. A vontade inicial era ficar quieto e só observar, mas seguir assim era garantia de fracasso num curso que tanto sonhei. Então eu tinha que me arriscar, levantar a mão com convicção e expor o que eu faria na posição do protagonista do caso estudado (Harvard ensina 100% do seu currículo de sala de aula através de cases reais, onde os alunos são provocados a se posicionar em relação ao dilema vivido pelos protagonistas; ao longo do MBA de 2 anos, são mais de 500 cases estudados). Os cases, assim como a vida real, são sempre cheios de ambiguidade; não há certo e errado.

O meu nível de segurança em relação à assertividade do meu posicionamento era tipicamente muito baixo; porém, aprendi a me inspirar nos colegas americanos que falavam com tanta convicção. Aos poucos, fui expondo os meus argumentos como se tivesse certeza absoluta do que estava falando. Percebia que, assim, a qualidade das discussões que se seguiam e os feedbacks dos professores em relação ao meu desempenho em sala de aula eram muito melhores. Isso aumentou minha confiança no meu raciocínio e passei a arriscar mais, trazendo pontos de vista mais radicais e provocando discussões mais contraditórias e interessantes. Gradativamente, minha autoconfiança cresceu e eu já não precisava fingir tanto para parecer seguro sobre o que falava. Eu senti na pele o que é o fake it until you make it.

Então eu entendi que o fake it until you make it é frequentemente usado como um lema para motivar pessoas a agirem com confiança, mesmo que não se sintam completamente preparadas ou seguras em determinada situação. Essa abordagem sugere que, ao adotar uma postura confiante, mesmo quando não estamos confiantes internamente, podemos alcançar o sucesso e desenvolver uma autoconfiança genuína ao longo do caminho.

A origem do fake it until you make it remonta ao campo da psicologia e ao conceito de “autopromoção”, proposto pelo psiquiatra Alfred Adler. O cerne da ideia é que, ao assumir uma postura confiante e agir como se já estivéssemos alcançado o sucesso desejado, podemos influenciar positivamente nossa mentalidade e comportamento, criando oportunidades para o sucesso real. De forma prática, é aquele coordenador que já se comporta como se fosse gerente, o gerente que se comporta como diretor, o diretor que se comporta como CEO e dono da empresa. Eu já trabalhei com gerente que se comportava como sócio de fundo de investimento e para mim, sócio na época, foi muito fácil promovê-lo porque era evidente que ele já estava pronto para assumir o novo desafio. Ele havia internalizado que já estava lá e agia e se comunicava como tal. Ele não me tratava como chefe, e sim como par, trazendo sugestões e posturas que desafiavam a liderança e nos levavam a melhores decisões.

Deu tudo certo: concluí o programa sem levar “bombas” relevantes e aprendendo sobre meus pontos fortes

No livro “Act Like a Leader, Think Like a Leader” a professora Herminia Ibarra destaca a importância de se afastar de abordagens tradicionais e assumir uma postura mais dinâmica e experimental na busca do desenvolvimento de liderança. O cerne da obra gira em torno do conceito de que a mudança ocorre através da ação. Ibarra argumenta que, em vez de esperar por uma transformação interna para nos tornar líderes, devemos agir como líderes desde o início, buscando oportunidades para assumir responsabilidades e experimentar diferentes papéis. Ao agir dessa forma, ampliamos nossos conhecimentos e habilidades, desenvolvendo uma identidade de liderança mais autêntica e eficaz.

Por outro lado, na contramão do nosso crescimento, está o spotlight effect, para continuar usando expressões da terra do tio Sam. O “efeito holofote” refere-se a um fenômeno psicológico em que a pessoa tende a acreditar que está sendo observada e notada de forma mais intensa do que realmente está. Essa percepção leva a uma autoconsciência e preocupação excessiva com a própria aparência, comportamento e desempenho em situações sociais. Seria o contrário do fake it until you make it: neste, expomos mais do que somos, esticando o músculo do crescimento pessoal; no outro (spotlight effect), expomos menos do que somos por medo do julgamento, e encurtamos o músculo que alavanca o nosso crescimento.

O nome spotlight effect é uma metáfora que faz alusão a um holofote ou um refletor de luz, sugerindo que os outros estão focados em nós da mesma forma que uma luz brilhante em um palco. No entanto, na realidade, as pessoas tendem a estar mais envolvidas em seus próprios pensamentos e preocupações, e prestam menos atenção aos detalhes específicos sobre os outros.

Esse fenômeno pode ocorrer em diversas situações, desde eventos sociais até apresentações em público, entrevistas de emprego ou simples interações cotidianas. As pessoas que experimentam o efeito spotlight geralmente têm uma consciência aumentada de si mesmas, preocupando-se excessivamente com sua aparência, comportamento, palavras e ações, muitas vezes temendo serem julgadas ou avaliadas negativamente pelos outros.

É importante notar que o efeito holofote é uma percepção individual e subjetiva, e tipicamente não reflete a realidade. A maioria das pessoas tende a se concentrar mais em si mesmas do que nos outros, o que significa que os supostos erros ou falhas percebidos pelos indivíduos podem passar despercebidos pelos demais.

Nos anos 2000, um grupo de acadêmicos testou o efeito holofote na prática através de um estudo científico. Gilovich, Medvec e Savitsky (2000) pediram que os participantes do estudo usassem camisetas com uma estampa bem chamativa e, em seguida, estimassem quantas pessoas notaram e reconheceram o desenho. Os resultados revelaram que os participantes superestimaram significativamente a quantidade de atenção recebida. Em média, eles estimaram que 50% das pessoas que interagiram com eles notaram suas camisetas chamativas; na prática, apenas 25% de fato perceberam. Ou seja, tipicamente superestimamos o quanto os outros prestam atenção no que fazemos e deixamos de arriscar a exploração de novos comportamentos e territórios por motivos irracionais.

Sou um defensor da autenticidade e da verdade, e sei o quanto a exposição a novos contextos e desafios nos fazem crescer. O fake it until you make it, para mim, se tornou sinônimo de experimentação e exploração de temas novos. Com humildade e autoconhecimento, busco mostrar convicção nas minhas ações e narrativas, ao mesmo tempo que sempre reviso o que de fato está me trazendo crescimento e aprendizado e o que não está me servindo positivamente. Me esforço para não me segurar por medo da opinião alheia, sabendo que só através da tomada de risco é que avançamos em direção à nossa melhor versão.

Alex

Alice perguntou: Gato Cheshire… pode me dizer qual o caminho que eu devo tomar?
Isso depende muito do lugar para onde você quer ir – disse o Gato.
Eu não sei para onde ir! – disse Alice.
Se você não sabe para onde ir, qualquer caminho serve.

Lewis Carrol

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